Choro da Vida
É irónico... os tempos evoluem, pensamos nós. Evoluímos na ciência, evoluímos na tecnologia, evoluímos em termos de formação académica. Hoje a percentagem de pessoas, sobretudo mulheres, que ingressam no ensino superior é substancialmente superior ao que se verificava no séc. XX, que não teminou assim há tanto tempo. Hoje vemos as mulheres a ingressar no mercado de trabalho e já estranhamos o facto de uma mulher nos apresentar como profissão ser doméstica, ser mãe a tempo inteiro, dedicar-se à família. Os tempos mudaram, as mentalidades também. Tudo isto fruto de lutas que se iniciaram com os nossos antepassados e persistem até aos nossos dias: a luta pelos direitos humanos, a luta pelo direito de voto, a luta pela liberdade de expressão, a luta contra a exploração infantil, a luta a favor da igualdade de direitos da mulher, etc. De facto, percorrendo apenas os últimos 100 anos encontramos muitas melhorias que foram implementadas na nossa cultura, nas nossas gentes... contudo, ainda há tanto por construir, tantas barreiras por derrubar para se elevar novas construções.
Encontrei hoje no meu baú de memórias um poema escrito por mim em 2000, tinha eu apenas 13 anos. Verifiquei que se encontra tão atual como na altura em que o escrevi. Porque hoje ao lê-lo vejo as crianças na Síria, no meio da guerra. E continuo a questionar-me... será que globalmente evoluímos assim tanto? Ou evoluímos tão pouco? Como é possível que o mundo continue a experienciar episódios tão desumanos que apenas evoluíram nas armas utilizadas?
Choro da Vida
O dia belo estava,
Lá no alto o Sol brilhava
Um pássaro voava
E eu no meu canto pensava.
Pensava no Sol
Pensava na Lua
Pensava no Mundo
Nos meninos de rua.
Olhava o céu
E este escondia
A tristeza de um lado
E do outro a alegria.
A tristeza de uns
A alegria de outros
Problemas comuns
Atingindo quase todos.
Então no meu canto
Eu refletia…
Porquê tanta tristeza
E tão pouca alegria?
Porquê tanta injustiça,
Tanta guerra e pouca paz?
Porquê tanta cobiça,
O que isso nos traz?
Porquê tanto ódio,
Tanta raiva e rancor?
Porquê…? Num Mundo tão belo
Onde poderia haver amor?!
Vejo um rosto de criança
Chorando de sofrimento
Memória, lembrança
Presente no meu pensamento.
Por que chora de tristeza
E não de alegria?
Por que não vejo no rosto
Sorriso e harmonia?
Porquê o seu olhar
É uma flor que murchou?
Uma gota de mar
Que com a dor secou?
Que mal fez ela ao mundo?
Se apenas nasceu!
Vejo no seu olhar profundo
Que ainda nada viveu.
Criança que deveria ser
Símbolo de harmonia,
Energia diária,
Risos todo o dia.
Criança que é
O espelho da inocência,
Será que é difícil dar
Carinho e paciência?
Para quê destruir o Mundo
Qual a recompensa?
De que adianta isto tudo,
Qual a tença?
Num Mundo tão belo
Repleto do melhor,
Para quê reduzi-lo
Ao que há de pior?
Mundo com Luz
Com um sol brilhante,
Quem o reduz
E o torna arrepiante?
Quem não vê?
Quem não observa?
Os seus jardins
Tapetes de relva
As suas flores
Bem floridas
As suas cores
Bem coloridas
As suas nuvens
Bem vistosas
As suas árvores
Bem harmoniosas.
Os pássaros voadores
Perseguidos pelo vento
Cantando suas emoções
Enovando o pensamento.
As flores dançando
O mar ajudando à festa
As nuvens libertando
Pingos que refresca.
Choram, choram, choram
Não param de chorar
Quem chorasse como elas
Choro de alegrar.
Choro, choro esse
Que também quero ter
É um choro verdadeiro
Choro de quem sabe viver.
Não é choro de angústia
Ou choro de infelicidade
É um chorar diferente
Um choro de verdade.
Será que és tu…?
Ou será que sou eu…?
Quem não respeita o Mundo?
Ele não é meu nem teu!
O Mundo é nosso,
É de nós todos
Mas como eu posso
Dar-lhe tantos desgostos?
O Mundo deveria ser
Apenas de quem o respeita
Assim iria ter
Menos qualquer coisa desfeita.
Quem chora de alegria?
Quem já chorou de felicidade?
Quem sabe viver a vida,
Quem abandona a vaidade.
Por isso vou lutar
Por uma vida florida
Para que também possa chorar
Esse choro da vida.
Carla Lopes, 03/2000